Os “EUA em russo: desvendando o enigma das siglas na tradução

Desta vez, falarei sobre um assunto que envolve tradução, línguas russa, inglesa e portuguesa e, talvez, política. Afinal, onde não há política?

A intenção deste texto não é ser uma pesquisa de cunho acadêmico, mas sim falar de um assunto que pode ser do interesse de outros colegas, estudantes de idiomas e leitores de literatura russa ou apenas pessoas que se interessam por história e curiosidades gerais.

Fazendo algumas traduções, e também pesquisas para meu canal do YouTube (Russística), algumas vezes me deparei com a sigla “С.А.С.Ш.” (pronuncia-se como S.A.S.Cha), que significa “Estados Unidos da América do Norte”. Até aí, tudo bem, os Estados Unidos realmente fica na América do Norte, isso não me despertaria nenhum alerta se fosse escrito em português, inglês ou até mesmo em russo, mas por extenso. No entanto, estava escrito apenas as siglas “С.А.С.Ш.“, o que despertou o alerta automático, visto que é muito mais usado em russo a sigla “США“, assim, sem pontos entre as letras e que acostumamos a falar algo como “C-chá”. Claro, quando encontrei a sigla diferente para EUA, que inclusive havia um hífen na letra “A” (С.-А.С.Ш) indicando que era um adjetivo composto “Северо-Американские Соединенные Штаты“, que, traduzindo de maneira literal, ficaria algo como “Estados Unidos Norte-americanos”, utilizei o padrão “EUA” (Estados Unidos da América). E por quê? Devo dizer que “meus dedos coçaram” para utilizar a versão “Estados Unidos da América do Norte”, mas eu teria que escrevê-la por extenso, pois ficaria esquisito escrever “E.U.A.N” e depois ter que utilizar uma nota de rodapé. Além de já existir esta sigla para outra coisa, isso não era absolutamente relevante para o texto. Porém, como todo tradutor é, e deve ser, curioso por natureza, embarquei na pesquisa para saber o motivo pelo qual a URSS escrevia daquela maneira naquele e em alguns outros textos mais antigos. Logo de início, em uma busca simples no Yandex (o buscador da Rússia), vi uma resposta em que uma mulher dizia que aquela sigla se usava já na época anterior à Revolução Russa e assim manteve durante a URSS. Como a resposta carecia de fontes, parti para uma pesquisa de corpora em russo.

No site de pesquisa de corpora em língua russa (sim, porque tradutor não pode confiar apenas nas ferramentas de pesquisa; como dizia minha professora, Patrícia Gimenez: “O corpus não mente”), foram encontradas pouco mais de 140 ocorrências para “САСШ” e mais 19 para “С.А.С.Ш.” (Com pontos), constituídos de textos jornalísticos, artigos, diários ou cartas, excetuando apenas pouquíssimos textos literários, incluindo o texto de Vladímir Maiakóvski “Minha descoberta da América, escrito entre 1925 e 1926. Em um dado momento, Maiakóvski diz (tradução minha, do russo):

“…Quando se fala em “América”, nossa imaginação evoca a cidade de Nova Iorque, os tiozinhos americanos, mustangs, Coolidge e assim por diante; coisas pertencentes aos Estados Unidos da América do Norte. Estranho, mas verdadeiro. É estranho porque há três Américas: do Norte, Central e do Sul. Os E.U.A.N. [traduzido propositalmente de maneira literal] não ocupam sequer todo o Norte – veja só! – tiraram, apropriaram e incorporaram o nome de todas as Américas…”

Em outro momento (tradução minha, do russo):

“Que América e E.U.A.N. são a mesma coisa, todos sabem. Coolidge apenas formalizou esse negócio em um dos seus últimos decretos, chamando a si mesmos, e apenas a si mesmos, de americanos. O rugido de protesto de muitas dezenas de repúblicas e até de outros Estados Unidos (por exemplo, os Estados Unidos do México) que formam a América é em vão. A palavra ‘América’ está finalmente anexada.”

Neste texto de Maiakóvski, claramente ele demonstra sua desapreço com os EUA. No entanto, ele comete dois equívocos: o primeiro é culpar o presidente Coolidge de criar um decreto intitulando a si mesmos de americanos. O gentílico “americano” é empregado desde 4 de julho de 1776; o segundo equívoco foi nomear os EUA como “Estados Unidos da América do Norte” e em seguida, dizer “não ocupam sequer o Norte”. Maiakóvski pode culpar os EUA de “anexar” todas as três Américas ao seu nome ao se referir como “América”, mas quanto à América do Norte em seu nome oficial, ela “desanexou” o Norte ainda em 1778, conforme o texto a seguir (tradução minha, do inglês):

“Colônias Unidas” começou a aparecer nos “Diários do Congresso” em junho de 1775. Ao redigir a Declaração de Independência, Thomas Jefferson mudou “Colônias” para “Estados” para reconhecer a intenção da resolução. O Congresso flertou com “Os Estados Unidos da América do Norte” depois que os delegados adotaram os Artigos da Confederação. Os tratados com a França em 1778 referiam-se aos “Estados Unidos da América do Norte”. O Congresso usou esse nome em uma resolução envolvendo letras de câmbio com comissários na França em maio de 1778, mas os delegados abandonaram “Norte” em 11 de julho de 1778.”

Desta forma, por ‘ironia do destino” (como o famoso filme soviético), o Império Russo, mesmo após 1778, permaneceu chamando os EUA como “Estados Unidos da América do Norte” (САСШ., С.А.С.Ш., С.-А.С.Ш, СШСА) e isso permaneceu ainda nos tempos da URSS. Há indícios deste uso ainda em meados da década de 1930 e diminuindo sua ocorrência ao longo de todo o século XX. Porém, é espantoso, e até mesmo surpreendente, que ainda existam textos, sobretudo artigos jornalísticos e científicos, que ainda utilizam a antiga sigla. Ainda que seja do senso comum o uso da sigla “США” (relativo aos EUA ou USA em inglês).

Em uma vasta busca pela internet, vê-se que não há um consenso de quando e por que abandonaram a antiga sigla e aderiram à “nova”. Alguns dizem que é porque soa melhor ao falar (isso pode ser verdade, visto que a língua russa é cheia de siglas e acrônimos e posso comprovar que é mais fácil falar “c-chá”) ou que simplesmente aderiram ao congresso continental de 1778 (este pouco provável, devido ao atraso de alguns séculos).

Em suma, fica aqui a questão, ou talvez não seja uma questão, de como traduzir o nome dos EUA, seja a sigla, seja por extenso. Eu, como tradutor, prefiro aderir ao EUA ou USA (para o inglês), assim como por extenso. Desta forma, não corro o risco de ter como resultado um texto incompreensível ao leitor. Em literatura, talvez coubesse uma nota de rodapé com a explicação. Porém, isso pode ser completamente inútil, visto que não é uma questão de uso por política ou ideologia qualquer, foi apenas, talvez, por uma convenção ou falta de conhecimento.

E a conclusão?

A conclusão é de que um tradutor precisa ser curioso e nunca confiar na primeira informação que encontra em sua pesquisa. Todo esse texto é uma amostra do que passa um milhão de coisas na cabeça de um tradutor por conta de uma simples sigla. Desde o início, sabia que deveria utilizar a sigla EUA e por extenso “Estados Unidos da América”, mas a curiosidade me levou a essa extensa pesquisa (que levaram umas duas horas).

Ao menos, toda vez em que optar por “EUA” quando encontrar as diferentes opções incluindo o “Norte” no nome, terei embasamento e certeza da minha escolha.

Bem, assim são os dias de todos os tradutores, não é mesmo?

Há princesa, princesa e princesa

Que cada idioma tem a sua peculiaridade, todos nós sabemos. Sendo assim, a língua russa também não poderia ficar para trás nessa. Traduzo do idioma russo há um certo tempo, mas literatura traduzo apenas há dois anos. Então, não seria nenhuma surpresa se eu dissesse que já passei por muitos percalços (alguns engraçados, outros trágicos) durante esse período. Hoje, gostaria de falar sobre a diferença da palavra “princesa” na língua russa.

Antes de falar sobre a palavra em si, é preciso observar que, na Rússia tsarista, o título de príncipe e princesa era um título comum da nobreza, podendo haver inúmeros príncipes e princesas por todo o país. Portanto, o príncipe ou a princesa não era um título dado ao herdeiro do trono, como é comum no Ocidente. Os herdeiros do trono não eram príncipes, mas sim chamados de tsárevitch, os primogênitos, e grão-duque ou grã-duquesa os demais filhos e netos do tsar.

Enquanto temos na língua portuguesa apenas uma variante para “princesa” (a filha de um rei, de uma rainha, ou apenas uma cantada de péssimo gosto), em russo nós temos duas variantes: “КНЯЖНА [KNIEZHNÁ]”, usado para denominar a princesa solteira (portanto, filha de um príncipe e de uma princesa), e “КНЯГИНЯ [KNIEGUÍNIA]”, usado para denominar a princesa casada (portanto, filha de um príncipe e de uma princesa, ou casada com um príncipe). Complicado? Nem tanto, pois ao traduzir para o português não fazemos diferenciação entre os três tipos de princesas.

Lembro-me de uma das traduções que fiz (talvez Dostoiévski ou mesmo Tolstói, não me lembro), estava na metade da tradução e me deparo com algo do tipo: “- Княжна и княгиния разговоривали…” [A princesa e a princesa conversaram…]. Apenas ali, pela primeira vez, deparei-me com as duas palavras escritas lado a lado. Até então, em outros livros que traduzi, apareciam as duas variantes, mas nunca na mesma frase. Ou seja, eu sabia o significado das duas palavras (princesa), mas, durante a leitura, não me atentei à ligeira diferença entre elas, pois sempre vinha acompanhado do nome, e eu já sabia que se tratava de uma princesa (ainda que eu não distinguisse a casada da solteira). Por sorte, não temos essa diferença e nos outros livros deu tudo certo. Ah, qual foi a solução? Escrevi: “Ambas as princesas conversaram…” (algo assim, talvez.)

Desta forma, quando começamos a ler um livro de literatura russa e vemos que fala de príncipes e princesas, devemos ter em mente que não é apenas mais uma história de príncipe encantado e princesa feliz, como nas histórias ocidentais; há grandes chances de ter muito príncipe canalha e princesas infelizes, tudo com o bom e velho sofrimento russo. 🙂

Obrigado pela leitura e até a próxima! 🙂

Pequenas histórias de grandes livros – II

Continuando a série de livros Interessantes, hoje separei três livros que compõem a obra completa do conde Aleksei Konstantínovitch Tolstói (1817-1875), obviamente, é da família do famoso Liev Tolstói. Falando um pouco do autor, além de escritor, Aleksei Tolstói também foi tradutor. Dominava os idiomas: inglês, ucraniano, italiano, polonês, francês, alemão e latim; entre os autores traduzidos estão Goethe e Byron. Algumas de suas obras foram escritas originalmente em alemão e francês.

A respeito dos livros, dividem-se em três volumes: versos, prosas e dramaturgia. Foram publicados entre 1921 e 1922, em que o volume de prosas está completando um século. Estas edições foram impressas em Berlim, pela editora I. P. Ladizhnikov (IPL).

Assim como muitas obras publicadas fora da Rússia neste período, os livros foram todos impressos ainda com a ortografia pré-reforma (que ocorreu logo depois da Revolução Russa). Mais uma vez, talvez, uma forma de firmar uma posição política contrário à revolução. Outro aspecto que não se deve deixar de lado, é que Aleksei Tolstói escreveu inúmeras obras em homenagem aos tsares e tsarinas, o que levou a ser banida a sua publicação na URSS.

Estas edições chegaram a mim por intermédio de um amigo russo, que sua família foi exilada na China, em meados de 1917, e depois no Brasil, após a Revolução Chinesa. Portanto, esse livro carrega consigo uma história peculiar.

Voltando às obras, Aleskei Tolstói é considerado o primeiro autor russo a escrever sobre a temática gótica (com vampiros, lobisomens, etc). Escreveu o conto “A família de Vurdalak” (imagem acima), escrito originalmente em francês, traduzido para o russo por B. M. Markevitch, em 1884 (imagem abaixo). Ao contrário do que se pensa, Vurdalak nada tem a ver com o conto de Poe, pois Vurdalak é uma criatura da mitologia eslava, parecida com um lobisomem, mas que se alimenta de sangue.

Um último detalhe, talvez não proposital, o conto citado termina justamente na pagina 666, encerrando a edição. 😈

Obrigado pela leitura e até a próxima! 😉

Pequenas histórias de grandes livros – I

Além de tradutor de literatura, também sou um leitor ávido e adoro saber o contexto histórico dos livros e, sobretudo, das suas publicações. Sendo assim, pretendo fazer uma série de textos contando um pouco do que sei a respeito de alguns livros que tenho e que considero ter uma história interessante.

O primeiro livro do qual gostaria de falar é o “Grandes escritores russos do século XIX”, de Konstantin Motchuski.

Este livro foi escrito na Franca, por um russo, exilado após a Revolução Russa, lançado pela Dom Knigi (Casa do livro) de Paris, a mesma famosa casa de livros russa. Uma das curiosidades é que foi escrito pensado na juventude, filhos dos imigrantes russos. (Imagem acima)

O próprio autor escreveu que foi feito para a juventude, para quando resolver retornar para sua pátria, não seja um estranho; caso decida ficar na Europa, que sirva para se orgulhar e espalhar a cultura e a grandiosidade da literatura russa. (Imagem abaixo)

A segunda curiosidade é que, apesar de publicado em 1939, o livro foi todo escrito segundo as regras anteriores à reforma de 1917, que se concretizou por volta de 1929, onde alteraram o alfabeto e alguns pontos da gramática. (Imagem abaixo)

Certamente mantiveram a escrita antiga porque o autor emigrou antes da reforma e era esta a escrita que ele dominava. Porém, pode haver o aspecto político, como uma negação à revolução e às ideias socialistas.

Até a próxima! 🙂

“O retrato” – Arseni Tarkóvski


Ninguém em meu quarto.
Na parede há um retrato.

Pelos olhos cegos da velhoca
Anda uma muriçoca, muriçoca, muriçoca.

É bom, digo eu,
No paraíso sob o vidro seu?

Pela bochecha sobe uma muriçoca,
Responde-me a velhoca:

— E você, em seu quartinho,
É bom estar sozinho?

*traduzido por Robson Ortlibas sem fins lucrativos. Caso utilize, cite a fonte.

ПОРТРЕТ

Никого со мною нет.
На стене висит портрет.

По слепым глазам старухи
Ходят мухи, мухи, мухи.

Хорошо ли, — говорю, —
Под стеклом твоём в раю?

По щеке сползает муха,
Отвечает мне старуха:

— А тебе в твоём дому
Хорошо ли одному?

Carta de Tolstói a Strákhov sobre a morte de Dostoiévski

Liev Tolstói, apesar de ter vivido na mesma época de Fiódor Dostoiévski, esses dois gênios da literatura russa e mundial, de pensamentos tão opostos, nunca se encontraram. Porém, Tolstói e Dostoiévski chegaram a estar em um mesmo ambiente. Este fato ocorreu no dia 10 de março de 1878, em uma aula pública do filósofo Vladímir Solovióv. Este tinha um grande amigo em comum, tanto com Dostoiévski como com Tolstói, era o filósofo Nikolai Strákhov, com quem Tolstói trocou inúmeras correspondências. Tolstoi ficou sabendo deste “quase encontro” apenas após a morte de Dostoiévski.

Em uma das cartas escritas por Strákhov a Tolstói, este e informado da morte de Dostoiévski. Tolstói apressou-se em respondê-la ao amigo o quanto antes. Eis a carta a Strákhov que Tolstói comenta a morte de Dostoiévski:

Iásnaia Poliana, 5-10(?) de fevereiro de 1881.

Recebi agora sua carta, caro Nikolai Nikoláitch, e apressei-me em respondê-la.

Naturalmente, refere-se à minha carta.

Como eu gostaria de poder dizer tudo o que sinto a respeito de Dostoiévski. O senhor, ao descrever seu sentimento, expressou parte do meu. Eu nunca encontrei esse homem e nunca tive relação direta com ele e, de repente, quando ele morreu, percebi que ele mesmo era a pessoa mais próxima, querida e necessária para mim. Eu era um escritor e os escritores são todos vaidosos, invejosos, ao menos eu sou um escritor deste tipo. E nunca me veio à mente comparar-me com ele, nunca. Tudo o que ele fez (é bom, é genuíno o que ele fez), era de tal modo que, quanto mais ele fizesse, melhor era para mim. A arte causa-me inveja, a inteligência também, mas o assunto do coração causa-me apenas alegria. Eu o considerava tanto como meu amigo, e não pensava outra coisa senão que nos encontraríamos, e que agora apenas não aconteceu, mas que isso era algo meu. E subitamente, na hora do jantar, eu jantava sozinho, atrasei-me, leio que ele morreu. De alguma forma o ponto de apoio foi arrancado de mim. Fiquei confuso, e depois se tornou claro como ele me era querido, até chorei e estou chorando agora.

Nos dias anteriores à sua morte, li “Humilhados e ofendidos” e fiquei comovido.

No funeral, por intuição, eu sabia que, por mais que os jornais criticassem tudo isso, era um sentimento genuíno.

O que acha da carta da esposa? Neste momento não preciso de livros. Sou muito grato ao senhor. Abraço-o e amo o senhor de todo o coração.

Seu L. Tolstói.

Vassíli Ivánitch sempre pede para transmitir-lhe seu amor e respeito.”

Original em russo:

“1881 г. Февраля 5—10? Я. П.

Получилъ сейчасъ ваше письмо дорогой Николай Николаичъ, и спешу вамъ ответить.

Разумеется ссылайтесь на мое письмо.

Какъ бы я желалъ уметь сказать все, чтo я чувствую о Достоевскомъ. Вы, описывая свое чувство, выразили часть моего. Я никогда не видалъ этаго человека и никогда не имелъ прямыхъ отношенiй съ нимъ, и вдругъ, когда онъ умеръ, я понялъ, что онъ былъ самый, самый близкiй, дорогой, нужный мне человекъ. Я былъ литераторъ и литераторы все тщеславны завистливы, я по крайней мере такой литераторъ. И никогда мне въ голову не приходило меряться съ нимъ — никогда. Все, чтò онъ делалъ (хорошее, настоящее, чтò онъ делалъ), было такое, что чемъ больше онъ сделаетъ, темъ мне лучше. Искуство вызываетъ во мне зависть, умъ тоже, но дело сердца только радость. — Я его такъ и считалъ своимъ другомъ, и иначе не думалъ, какъ то, что мы увидимся, и что теперь только не пришлось, но что это мое. И вдругъ за обедомъ — я одинъ обедалъ, опоздалъ — читаю умеръ. Опора какая то отскочила отъ меня. Я растерялся, а потомъ стало ясно, какъ онъ мне былъ дорогъ, и я плакалъ и теперь плачу. —

На дняхъ, до его смерти, я прочелъ Униженные и оскорбленные и умилялся. —

Въ похоронахъ я чутьемъ зналъ, что какъ ни обосрали все это газеты, было настоящее чувство. —

Что скажете на письмо жены? — Книги въ эту минуту не нужно. Очень благодарю васъ. Отъ всей души обнимаю и люблю васъ.

 Вашъ Л. Толстой.

Вас[илiй] Иванычъ всякiй разъ проситъ передать вамъ свою любовь и уваженiе.”

Fonte do original em russo: http://tolstoy-lit.ru/tolstoy/pisma/1880-1886/letter-32.htm

Artigo publicado originalmente em: https://www.linkedin.com/pulse/carta-de-tolstói-strákhov-sobre-morte-dostoiévski-robson-ortlibas/?published=t

Como os russos pronunciam os nomes de seus escritores?

Quem nunca ficou confuso ao tentar ler ou pronunciar os nomes de alguns dos grandes escritores russos? E o que dizer sobre os nomes dos personagens e até das obras? Sim, não é uma tarefa das mais fáceis, mas vamos começar pelos nomes dos autores. A dificuldade se dá, principalmente, por não estarmos inseridos na cultura russa e nem mesmo no idioma russo, como estamos inseridos na cultura de língua inglesa em geral (filmes, livros, séries, comerciais, etc.).

Pensando nisso, resolvi preparar uma pequena lista com os nomes de alguns dos mais famosos escritores russos. Não sou professor de língua russa, não sou russo e muito menos tenho a intenção de apontar “erros” (afinal, o que é um erro?) ou corrigir a maneira com que os leitores falam os nomes dos seus autores favoritos. Vale lembrar que somos brasileiros e falamos português. Ademais, não temos obrigação alguma em saber pronúncias estrangeiras; pelo simples fato de que muitos destes nomes já se tornaram até mesmo famosos na pronúncia largamente usada no Brasil. (Até mesmo entre especialistas em literatura russa)

Sendo assim, vamos à lista!

Obs.: para simplificar, usarei o nome tal como é grafado no Brasil, seguido da sua pronúncia aproximada e, por fim, como é escrito em russo.

LIÉV TOLSTÓI

O nome do grande autor de Guerra e paz já foi grafado de diversas maneiras, desde Leão até Leon. No entanto, ultimamente é mais comum grafá-lo tal como ele é em russo:

Liév Tolstói = Liêv Talstôi = Лев Толстой.

É muito comum cometermos o engano de ler os acentos agudos como vogais abertas, no entanto, em russo não há esse tipo de som. Sendo assim, quando se utiliza acentos agudos nas vogais “e” e “o” é apenas para marcar a tônica, e esta deve ser pronunciada com o som fechado, como o som do nosso acento circunflexo.

ALEKSANDR PÚCHKIN

O nome do grande poeta e o símbolo máximo da poesia e até da língua russa, não encontramos grandes dificuldades em pronunciá-lo. A única ressalva é quanto à grafia de seu nome, que pode variar entre Aleksander, Alexander ou Aleksandr.

Aleksandr Púchkin = Aleksándr Púchkin = Александр Пушкин.

FIÓDOR DOSTOIÉVSKI

O autor de Crime e castigo e “queridinho” dos brasileiros, talvez tenha um dos nomes mais difíceis de encontrar alguém pronunciando da maneira como os falantes de russo pronunciam.

Fiódor Dostoiévski = Fiôdar Dastaiêvski = Фёдор Достоевский.

MIKHAIL BULGÁKOV

O autor de O mestre e margarida também tem um nome bastante complicado para nós brasileiros.

Mikhail Bulgákov = Mikhaíl Bulgákav = Михаил Булгаков.

O som do dígrafo “KH” tem o som igual à letra “H” de “Harry Potter” ou do som de “RR” do português.

VLADIMIR NABOKOV

           O controverso autor de Lolita, embora escrevera sua grande obra primeiramente em inglês, ainda assim pode ser considerado um escritor de literatura russa.

Vladimir Nabokov = Vladímir Nabôkav = Владимир Набоков.

NIKOLAI GÓGOL

O grande escritor de Almas mortas também costuma ser chamado de “Nicolau”, que é a versão do seu nome em língua portuguesa.

Nikolai Gógol = Nikalái Gôgal = Николай Гогол.

ANTON TCHÉKHOV

Esse provavelmente está no grupo dos que raramente se encontrará no Brasil alguém pronunciando como os russos.

Anton Tchékhov = Antôn Tchêkhav.

Mais uma vez, temos o mesmo dígrafo que vimos em Mikhail.

MAKSIM GÓRKI

Este nome também pode ser encontrado como “Máximo”, que o seu análogo em língua portuguesa.

Maksim Górki = Maksím Gôrki = Максим Горький.

BORIS PASTERNAK

O nome do autor de Doutor Jivago pode surpreender algumas pessoas com a forma que é pronunciado pelos russos.

Boris Pasternak = Barís Pasternák = Борис Пастернак.

ALEKSANDR SOLZHENÍTSIN

O grande escritor que recebeu o prêmio Nobel de literatura, autor de Arquipélago Gulag.

Aleksandr Solzhenítsin = Aleksándr Saljenítsin = Александр Солженицын.

EVGUÊNI ZAMIÁTIN

Considerado o pai da distopia, influenciou H.G. Wells e George Orwell, autor de Nós.

Evguêni Zamiátin = Ievguêni Zamiátin = Евгений Замятин.

IVAN TURGUÊNEV

O grande autor de Pais e filhos, que é considerada uma das maiores obras do século XIX.

Ivan Turguênev = Iván Turguêniev = Иван Тургенев.

VLADIMIR MAIAKÓVSKI

O famoso poeta soviético é considerado o “poeta da revolução”.

Vladimir Maiakóvski = Vladímir Maiakôvski = Владимир Маяковский.

ANNA ARKHMÁTOVA

Grande poeta russa, foi uma das mais importantes poetas acmeísta.

Anna Arkhmátova = Anna Arkhmátava = Анна Ахматова.

Aqui, no dígrafo “KH” que antecede uma consoante, soa como se fosse soltando o ar, como se pronunciasse “RR” sem nenhuma vogal.

MARINA TSVETÁEVA

Mais uma grande poeta russa, autora de muitas obras, entre elas Meu Púchkin.

Marina Tsvetáeva = Marina Tsvetáieva = Марина Цветаева.

SERGUEI IÊSSENIN

Poeta russo, viveu na mesma época de Maiakóvski e autor de uma vasta obra poética.

Serguei Iêssenin = Serguêi Iêssienin = Сергей Есенин.

IOSSIF BRÓDSKI

Grande poeta russo, que migrou para os EUA e também recebeu o prêmio Nobel de literatura.

Iossif Bródski = Iôssif Brôdski = Иосиф Бродский.

SERGUEI DOVLÁTOV

Outro grande escritor moderno russo, também imigrou para os EUA e era grande amigo de Bródski.

Serguei Dovlátov = Serguêi Davlátav = Сергей Довлатов.

MIKHAIL LÉRMONTOV

O grande autor de O herói do nosso tempo.

Mikhail Lérmontov = Mikhaíl Liêrmantav = Михаил Лермонтов.



Essa lista poderia se alongar por muitas páginas, mas acredito que por ora é o bastante, ao menos para ter uma ideia de como pronunciar seus nomes.

E lembrem-se, não há forma “correta”. Até mesmo nessa pequena lista pode haver discordâncias. Até mesmo nós, tradutores de russo, muitas vezes não conseguimos nos entender com a grafia desses nomes.

No fim das contas, o “correto” é ler suas obras e apreciar a maravilhosa literatura russa. 

*Publicado originalmente em: https://www.linkedin.com/pulse/como-os-russos-pronunciam-nomes-de-seus-escritores-robson-ortlibas/

“Pata minha, pata…” Robert Rozhdestvensky

Pata minha, pata,

Focinho meu, focinho,

Eu aprenderei a chorar

Sem voz e quietinho.

Eu aprenderei a pensar

Muito e sem histeria,

O orgulho trancarei nos porões

E aprenderei a ACREDITAR!

Maravilha minha, maravilha,

Prazer meu, prazer,

Se quiser, passo todo

O fim de semana com você?

Se quiser, com carinho afaga

Com o seu molhado focinho.

Se quiser um conto de fada?

Apenas VIVA, cãozinha!

Tradução do russo*: Robson Ortlibas.

*traduzido sem fins lucrativos. Caso utilize, cite a fonte.

Лапа моя, лапа,

Носа моя, носа,

Я научусь плакать

Тихо и безголосо.

Я научусь думать

Много и без истерик,

Гордость запру в трюмы

И научусь ВЕРИТЬ!

Чуда моя, чуда,

Рада моя, рада,

Хочешь, с тобой буду

Весь выходной рядом?

Хочешь, прижмись с лаской

Мокрым своим носом.

Хочешь про снег сказку?

Только ЖИВИ, пёса!

Escute! (Vladimir Maiakóvski)

maiakovski

Escute!
Afinal, se as estrelas acendem
significa que alguém precisa?
Significa que alguém quer que elas existam?
Significa que alguém chama essas besteiras de pérolas?
E, enfraquecendo-se
nas nevascas do pó do meio-dia,
corre para Deus,
teme, porque se atrasou,
chora,
beija-Lhe a mão descarnada,
pede
para que sempre haja uma estrela!
jurando
que não suportará esse tormento sem estrelas!
Mas depois
andando perturbado,
mas calmo por dentro.
Fala a alguém:
“Afinal, agora está bem?
Sem medo?
Não é?!”
Escute!
Afinal, se as estrelas
acendem
significa que alguém precisa?
Significa que é necessário,
que todas as noites,
sobre os telhados,
acenda ao menos uma estrela?!
1914

Tradução do russo*: Robson Ortlibas.

*traduzido sem fins lucrativos. Caso utilize, cite a fonte.


Послушайте!

Послушайте!

Ведь, если звезды зажигают –

значит – это кому-нибудь нужно?

Значит – кто-то хочет, чтобы они были?

Значит – кто-то называет эти плевочки

жемчужиной?

И, надрываясь

в метелях полуденной пыли,

врывается к богу,

боится, что опоздал,

плачет,

целует ему жилистую руку,

просит –

чтоб обязательно была звезда! –

клянется –

не перенесет эту беззвездную муку!

А после

ходит тревожный,

но спокойный наружно.

Говорит кому-то:

“Ведь теперь тебе ничего?

Не страшно?

Да?!”

Послушайте!

Ведь, если звезды

зажигают –

значит – это кому-нибудь нужно?

Значит – это необходимо,

чтобы каждый вечер

над крышами

загоралась хоть одна звезда?!

1914

Quando o amor morre… (Marina Tsvetaeva)

0e17febd522cd9389b04ce5c00f25aec_L

 

“Quando o amor morre – ressuscitá-lo é impossível.

Resta-se o vazio, o tédio e a indiferença.

Matar o amor não se pode – ele morre por si,

restando apenas cinzas e um terrível e indescritível rancor,

rancor àquele que este amor em nós – causou,

mas guardar – não deu, não pôde…”

 

Tradução do russo*: Robson Ortlibas.
*traduzido sem fins lucrativos. Caso utilize, cite a fonte.

__

“Когда любовь умирает — воскресить её невозможно.

Остаётся пустота, скука и равнодушие.

Убить любовь нельзя — она умирает сама,

оставляя голое пепелище и страшную невыразимую обиду,

обиду на того, кто эту любовь в нас — вызвал,

но сохранить — не дал, не смог…”